De: J.E.O.BRUNO
Para: Maria Lucia Massot
Enviada em: sábado, 23 de setembro de 2000 14:02
Assunto: ODE ao RIO DE JANEIRO - (Pablo Neruda)
"ODE ao RIO" - (porta delirante de uma casa vazia)
O poema de Pablo Neruda , "Ode ao Rio de Janeiro", num momento de ternura, começa como um cântigo de amor e deslumbramento pela cidade, aos poucos se transforma em lamento pelo contraste entre a beleza do lugar e a miséria do seu povo. Neruda, que escreveu o poema em 1956, depois de uma viagem ao Brasil,percebeu o quanto são poucos os que conseguem realizar as fantasias que ela desperta e promete à primeira vista.
Por isso chamou-a de "porta delirante de uma casa vazia..." Neruda também percebeu e registrou a sensualidade difusa,uma tensão erótica,e chamou-a de"Antigo Pecado","Salamandra Cruel","Sodoma". E termina com um apelo poético para que um dia os filhos da "cidade maravilhosa",sejam elevados à mesma dignidade da sua beleza.
"Aquele abraço"
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Ode ao Rio de Janeiro
Rio de Janeiro,a água
é
a tua bandeira,
agita as suas cores,
sopra e retine no
vento,
cidade,
negra náiade,
de claridade sem fim,
de
abrasadora sombra,
de pedra com espuma
é o teu tecido,
o
cadenciado balanço
da tua rede marinha,
o azul
movimento
dos teus pés areentos,
o aceso ramo
dos
teus olhos.
Rio, Rio de Janeiro,
os
gigantes
salpicam a tua estátua
com pontos de
pimenta,
deixaram
na tua boca
dorsos do
mar,
barbatanas
pertubadoramente mornas,
promontórios
da
fertilidade,tetas da água,
declives de granito,
lábios
de ouro,
e entre as pedras quebradas
o sol
marinho
iluminando
rutilantes espumas.
Ó Beleza,
ó
cidadela
de pele fosforescente,
romã
de carne azul, ó
deusa
tatuada em sucessivas
ondas de ágata negra,
da
tua nua estátua
um aroma de jasmim molhado
se
desprende,vem no suor,um ácido
pegajos
de cafezais e de
frutarias
e pouco a pouco sob o teu diadema,
entre a dupla
maravilha
dos teus seios,
entre cúpula e cúpula
da
tua natureza
aparece o dente da desgraça,
a cancerosa
cauda
da miséria humana,
nos montes leprosos
o cacho
inclemente
das vidas,
pirilampo terrível,
esmeralda
extraída
do
sangue,
o teu povo estende-se
até aos confins da
selva
num rumor abafado,
passos e surdas vozes,
migrações
de esfomeados,
escuros pés com sangue,
o teu povo,
para
lá dos rios,
na densa
amazônia,
esquecido,
no
Norte
de espinhos,
esquecido,
com sede nos
planaltos,
esquecido,
nos portos mordido
pela
febre,
esquecido,
à porta
da casa de onde o
expulsaram,
pedindo-te
apenas um olhar,
esquecido.
Noutras terras,
reinos,
nações,
ilhas,
a cidade capital,
a
coroada,
foi colmeia
de trabalhos humanos,
amostra do azar
e
do acerto,
fígado da pobre monarquia,
cozinha da pálida
república.
Tu és a
espelhante
montra
de uma sombria noite,
a
garganta
coberta
de águas marinhas
e ouro
de um
corpo
abandonado,
és a porta
delirant
de uma casa
vazia,
és
o antigo pecado,
a
salamandra
cruel,
intacta
na fogueira
das longas dores do
teu povo,
és
Sodoma,
Sim,
Sodoma
deslumbrante,
com
um fundo sombrio
de veludo verde,
rodeada
de crespa sombra,
de águas
ilimitadas, dormes
nos braços
da
desconhecida
Primavera
dum planeta selvagem.
Rio, Rio de Janeiro,
quantas
coisas tenho
para te dizer. Nomes
que nunca
esquecerei,
amores
que amadurecem o seu perfume,
encontros
contigo,quando
do teu povo
uma onda
agregue ao teu diadema
a
ternura,
quando
à tua bandeira de águas
subam
as estrelas
do homem,
não do mar,
não do
céu,
quando
no esplendor
da tua auréola
eu
veja
o negro,o branco,o filho
da tua terra e do teu
sangue,
elevados
até à dignidade da tua
formosura,
iguais na luz resplandecente,
proprietários
humildes
e orgulhosos
do espaço e da alegria,
então, Rio
de Janeiro,
quando
alguma vez
para todos os teus filhos,
e
não somente para alguns,
abrires o teu sorriso,espuma
de
morena náiade,
então
eu serei o teu
poeta,
chegarei com a minha lira
para cantar em teu aroma
e
na tua cintura de platina
dormirei,
na tua
areia
incomparável,
na frescura azul do leque
que tu
abrirás no meu sono
como as asas de
uma
gigantesca
borboleta marinha.
Pablo Neruda, 1956
Nota: Poema extraído do livro : "Odas Elementales" de Pablo Neruda, traduzido para o português por Luis Pignatelli(Publicações Dom Quixote) Lisboa / 1999
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"Contra a estupidez humana, até mesmo os deuses lutam em vão"
Schiller
- Vista aérea da Favela Rio das Pedras, onde moram 50 mil pessoas (Itanhangá): os barracos estão avançando em direção à Lagoa do Camorim
Números
do déficit urbano e habitacional
(Jornal
O Globo, 21/07/99)
1,5 milhão de pessoas moram em favelas, condomínios degradados e loteamentos sem infra-estrutura. É o déficit urbano da cidade
10 mil famílias vivem em condições de alto risco, é o déficit habitacional. Cerca de 30 mil pessoas, ou quase a população inteira do bairro do Leblon
5,5 milhões é a população estimada do Rio