Jornal O Globo, Cartas dos Leitores,
Terça-feira, 20 de janeiro de 1998
Favela-Bairro
.Com relação ao artigo da senadora
Benedita da Silva, "O novo apartheid" é espantoso o desconhecimento
da autora sobre os objetivos do programa Favela-Bairro, que visa
justamente a abertura das favelas, rompendo com as barreiras
visíveis e invisíveis. E espantoso também que Bené, senadora
nacionalmente conhecida, nunca tenha se interessado pelo programa a
não ser estabelecer críticas pretensamente ideológicas. Na verdade,
o objetivo é de que sejam criados os limites virtuais, tipo muro
baixo ou cerca, para que sejam visíveis as ocupações irregulares
fora dos limites do novo bairro. Quero lembrar, também, que na área
urbana as casas tem muros e os edifícios tem seus limites onde o
espaço público e o espaço privado estão bem definidos,
impedindo, desta forma, as
construções irregulares e ninguém é considerado gado. Sugiro ver um
Favela-Bairro cercado, como Vidigal ou Floresta da Barra.
MARIA LUCIA PETERSEN
gerente do Programa Favela-Bairro, Secretaria municipal de Habitação
(14/01)
· Em carta ao GLOBO, a sra. Maria Lúcia
Petersen, gerente do Programa Favela-Bairro, afirma que eu
desconheço os objetivos desse programa, ao criticar, neste mesmo
jornal, a decisão do prefeito do Rio de cercar as favelas para
impedir o seu crescimento. Quero esclarecer o seguinte: 1. Em meu
artigo não citei o Favela-Bairro, limitando-me a criticar a
construção de muros e a instalação de fios de aço em torno das
favelas, que foi o tema enfocado pela polêmica. Mas, reitero a minha
opinião de considerar essa medida do prefeito autoritária,
discriminatória e ineficaz pois as favelas nunca serão contidas com
repressão, como mostra a sua própria história. Se cercar favelas é
objetivo do Programa Favela-Bairro, lamento muito e registro aqui
minha total discordância; 2. A argumentação da Sra. Maria Lúcia de
que o muro de uma favela não se diferencia da cerca de um.
condomínio, além de falsa é contraditória. Falsa, porque favela é
bairro e não' condomínio. Contraditória, porque, se o objetivo do
programa é transformar favela em bairro, o que apoio integralmente,
não existe no Rio de Janeiro nenhum bairro cercado. Além disso, não
sei como o prefeito vai conseguir a "abertura das favelas"
cercando-as com muros; 3. As críticas que faço ao Programa
Favela-Bairro não se referem ao seu objetivo mais evidente, mas a
sua insuficiência, já que atingiu apenas cerca de 75 favelas, num
universo de mais de 500. Referem-se, também, ao método autoritário
de implantação do programa, feito sem discussão com as comunidades.
BENEDITA DA SILVA, senadora (PT/RJ)
(21/01),Rio
· A senadora Benedita da Silva tem razão
quando reivindica a extensão do projeto Favela-Bairro para novas
comunidades, mas se equivoca ao criticar a construção de limites
físicos (muro, cerca ou gradeado) na fronteira das favelas
urbanizadas com as áreas verdes (O GLOBO, 26/01). Projetos como
Favela-Bairro, Mutirão de Reflorestamento e outros, que procuram
integrar a favela à cidade formal, implicam benfeitorias e novos
direitos de cidadania, mas, também, deveres da comunidade em relação
ao meio ambiente e a sua própria segurança. Atualmente, no Rio, a
maior parte da construção irregular não é feita por famílias sem
teto mas por grileiros profissionais que ocupam, desmatam, constróem,
vendem... e vão desmatar mais alto. Os moradores e suas lideranças
legítimas, temerosos de novas construções a montante, em áreas cada
vez mais íngremes, sujeitas a erosão e deslizamentos, são, em geral,
favoráveis à construção desses limites físicos que, isoladamente,
seriam inócuos. Melhorar as condições de vida, integrar as favelas à
cidade formal e pactuar a auto-regulação são, na verdade, três
aspectos inseparáveis se não quisermos novas favelas por cima das
que estão sendo urbanizadas, com o risco de, literalmente, mandar
todo o esforço por água abaixo.
ALFREDO SIRKIS (por e-mail, 27/01),
Rio
· Gostaria de prestar alguns
esclarecimentos em relação à carta "Favelas", da senadora Benedita
da Silva. O programa Favela-Bairro realizou, só em 1997, 335
reuniões nas 75 comunidades que têm projetos e obras em andamento,
com a participação de 24 mil moradores. Nessas reuniões, as
organizações comunitárias se fortalecem através de discussão,
aprovação e acompanhamento dos projetos urbanísticos e obras, com o
desenvolvimento dos programas de alcance social, que abram os
espaços para o exercício da cidadania. Nunca comparei as favelas com
os condomínios. Apenas me referi às casas e edifícios da cidade que,
independente mente da situação econômica e social de seus moradores,
estão sujeitos às normas de ocupação do solo representadas,
inclusive, pelos muros que delimitam os espaços privados.
MARIA LÚCIA PETERSEN, gerente do
programa Favela-Bairro, Secretaria municipal de Habitação (27/01),
Rio
· Quero lembrar à Dra. Maria Lucia
Petersen que há mais de um ano lhe foi sugerido por nós murar um
conjunto habitacional, aberração construída pela Prefeitura, sem
licença, sem respeitar os parâmetros de edifícios e invadindo um
terreno particular no Recreio dos Bandeirantes. Não obtivemos
resposta. Sugiro à senadora Benedita da Silva que visite a Rua Leon
Eliachar, onde poderá constatar que os "carentes" contemplados têm
carro do ano, importado, e alguns já venderam suas casas por um bom
preço. Os limites deste conjunto são as casas vizinhas, já que
utilizam as ruas para comércio e lazer interrompendo a passagem.
Gado somos nós, contribuintes, que vivemos entre muros e grades...
conduzidos por esta prefeitura que nos tira os direitos de cidadãos.
LILIANE MARIA GUISE DA FONSECA COSTA e
MARIA ELVIRA MOTTA DIAS LOPES
Conselho Comunitário da Recreio (26/01), Rio
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